Imagine a cena: você, profissional experiente, com referências e ótimo desempenho é convidado para palestrar em um evento de grande porte. Falar do que você entende pode não ser um desafio no escritório, mas e diante de uma plateia desconhecida?
Nessas horas, muitos “comos” podem surgir: como organizar e estruturar um roteiro? Como não passar por chato ou arrogante? Como inspirar e ganhar o coração das pessoas? A sensação de não conseguir transformar aquilo que se sabe numa boa história costuma assombrar vários profissionais.
Embora uma mentoria de storytelling seja uma opção interessante, saiba que nem sempre ela se aplica a todos os casos, e darei um exemplo disso logo mais.
Senta que lá vem história…
Certa vez, recusei um trabalho de mentoria para um empresário. Dono de uma startup que oferecia soluções tecnológicas na área de Compras, fora chamado para palestrar em um evento relevante e estava a um passo de aceitar.
Mas algo o deteve.
O convite ocorreu graças a um artigo publicado em seu blog. A chance de palestrar sobre o tema do artigo lhe parecia ótima, não fosse uma questão: ele não era o autor do texto. Para melhorar o posicionamento do blog no Google, tinha contratado os serviços de um redator freelancer, que produzia posts sobre assuntos ligados a Compras e Suprimentos. Em um desses posts, a temática foi tão bem trabalhada que chamou a atenção.
A empresa organizadora do evento procurou por especialistas naquele tema e acabou encontrando o post do blog dele, assinado por… ele. Como o tema ainda era pouco explorado no Brasil, entraram em contato, convidando-o para palestrar.
Seduzido pela ideia, achou que valia a pena arriscar, devido à fama do evento e possibilidade de ampliar seu networking. Pensou: “Mesmo que eu não seja um especialista, posso contratar alguém que me ajude a contar uma história e impressionar!”
Ah, se a realidade correspondesse à nossa imaginação…
Logo na primeira reunião de mentoria, diante de perguntas relacionadas aos elementos-chave do Mapa da Narrativa, ficou claro que ele teria dificuldades. Seria necessária muita pesquisa, a fim de explicar algo que simplesmente não fazia parte da experiência dele. Constrangedor, não?
Refleti e recomendei a ele que entrasse em contato com a organização, declinando o convite. Afinal, eram altas as chances de não conseguir, em pleno palco, sustentar o proposto.
Uma coisa era o “antes” e o “durante”, ou seja, o ensaio e a apresentação em si. Mas e o “depois”? E os famosos “e se…”? E se fizessem perguntas sobre um caso específico que ele viveu? E se pedissem para falar de determinada situação ou lhe questionassem sobre o rumo do negócio aqui no Brasil, numa clássica comparação entre países?
Uma boa palestra não sobrevive apenas com conteúdo retirado da internet. As vivências são essenciais, pois contribuem para diferenciar o “blábláblá” do “esse cara sabe o que diz!”. Se continuasse insistindo, ao invés de construir networking, nosso palestrante ia construir um “notworking”! Ia ganhar detratores em vez de novos clientes!
Por fim, ele agradeceu, aliviado. Ficou surpreso também, pois não é todo dia que se recusa um trabalho já aprovado. Eu, mesmo perdendo um trabalho, senti que ganhei um cliente, que viu na minha decisão valores como transparência e verdade, e que vai me chamar quando tiver uma palestra sobre algo que domine e que realmente possa opinar.
A hora certa
A partir do relato acima, separei 3 perguntas que vão te ajudar a decidir se chegou a hora de contratar um mentor de narrativas.
As perguntas escolhidas têm como base a história das três peneiras de Sócrates. Na parábola, as peneiras são como filtros pelos quais um assunto deve passar antes de vir a público.
Na era da informação desenfreada na internet, onde todo mundo posta tudo que está a fim, é no mínimo inteligente praticar uma postura empática, segurando a impulsividade e avaliando seus desejos. Vamos analisar como a palestra do caso relatado se sairia diante das três peneiras?
#1. Peneira da Verdade: a história que quero contar já teve a veracidade checada?
Aqui a palestra já reprovaria. Afinal, o palestrante se apresentaria como especialista de um tema que não domina. Logo, se não tivesse declinado o convite, uma mentira seria contada de início. Pela provável falta de espontaneidade e familiaridade com o assunto, ele correria o risco de ser descoberto.
#2. Peneira da Bondade: a história que quero contar é algo bom e que eu gostaria que compartilhassem a meu respeito?
Mesmo que o palestrante utilizasse exemplos e casos reais, sua história não passaria de uma grande colcha de retalhos, feita com a ajuda de leituras que qualquer um encontraria no Google. Não seria algo ético, logo, não seria bom. E mais: ao propagar tudo aquilo a respeito de si mesmo, será que ele se sentiria tão orgulhoso assim?
#3. Peneira da Necessidade: a história que quero contar pode ajudar as pessoas?
Se o que gera conexão entre as pessoas é a empatia diante de casos reais, nosso palestrante ficaria em maus lençóis. Na mente dele, estar naquele palco seria muito bom para sua autoimagem, mas e para os outros, o que agregaria? Não adianta pensar apenas no seu marketing se aquilo que você entrega não é relevante. Dizem por aí que “conteúdo é rei”, mas isso só acontece porque o “reinado” lhe dá o devido crédito. Nesse caso, não teríamos um conteúdo válido e muito menos validado.
Essas foram as perguntas e respostas que elaborei antes de recusar o trabalho, ciente de que era a decisão certa.
Agora é a sua vez!
Se você já “peneirou” o seu caso e acredita que:
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sua história é tão “vida real” que você a contaria dezenas de vezes sem hesitar;
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há algo bom nela e você ficaria contente se a espalhassem por aí;
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e, finalmente, se pode interessar e passar uma mensagem útil, não só porque você a viveu, mas também porque talvez mais pessoas se identifiquem…
… então você certamente está pronto para receber uma mentoria de storytelling de quem entende! 🙂
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